A Assembleia Municipal de Loulé aprova por unanimidade a moção "Pelo Combate à Violência de Género", apresentada pelo Grupo Municipal do Bloco na sessão Extraordinária da 5 de Abril de 2019.
Moção - Pelo combate à violência de género
Considerando que:
(i) O combate à violência de género é um dos maiores desafios das nossas sociedades;
(ii) A violência de género toma várias formas, sendo Portugal assolado por um número de crimes de violência doméstica e violação muito elevado e maioritariamente direcionado contra mulheres, que devem fazer ponderar as medidas implementadas até hoje e novas formas de combater este flagelo;
(iii) Segundo o Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR-União das Mulheres Alternativa e Resposta, nos últimos 15 anos morreram 503 mulheres e cerca de 600 foram vítimas de tentativas de assassinato. No mesmo período, mais de 1000 crianças ficaram órfãs
(iv) Em 2018, registaram-se, em Portugal, 29.734 participações do crime de Violência Doméstica;
(v) Por outro lado, a violência doméstica é o crime contra as pessoas que mais mata em Portugal. Este crime continua a assumir-se como uma das principais formas de criminalidade, sendo que, nos crimes contra as pessoas, é apenas superado em número de ocorrências, pelo crime de ofensa à integridade física simples, segundo dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2017 (RASI 2017).
(vi) Apesar de, passados 18 anos, ser pacífico na sociedade portuguesa o mérito de se ter tornado a violência doméstica crime público, apesar das inúmeras campanhas de sensibilização, apesar de todas as denúncias, o crime de violência doméstica continua a ter uma prevalência muito grande;
(vii) Só este ano, 2019, já foram assassinadas 13 mulheres e 1 criança em contexto de violência doméstica e de relações de intimidade. Nestes casos, existiam já processos, queixas, tentativas de pedir ajuda que não foram ouvidas por ninguém. O sistema que deveria apoiar as vítimas de violência doméstica continua a falhar redondamente.
(viii) Por outro lado, o crime de violação atinge, sobretudo, mulheres e crianças. Apesar da neutralidade prevista no tipo legal de violação quanto ao género da vítima, este crime é, indubitavelmente, uma forma de violência de género, e uma das mais invisíveis.
(ix) Em Portugal, de acordo com os dados do RASI 2017, as participações do crime de violação aumentaram, de 2016 para 2017, 21,8% e foram apresentadas 408 queixas às forças de segurança. Segundo a mesma fonte, a esmagadora maioria de agressores enquadra-se em relações de proximidade familiar ou de conhecimento, sendo por isso falsa a ideia de que o crime de violação é cometido por estranhos.
(x) Neste quadro, afigura-se a necessidade de um debate aprofundado e sério da sociedade portuguesa, que ouça com mais atenção as várias organizações que trabalham diariamente com estes casos de violência, bem como organizações internacionais, profissionais da justiça, entre outros.
(xi) O parlamento português tem tido, em especial no último ano, várias discussões e apresentação de várias iniciativas legislativas, onde o Bloco de Esquerda tem participado activamente, referentes a esta problemática específica da violência doméstica e violação.
(xii) A gravidade da situação não se coaduna com o rejeitar de possíveis alterações à legislação, ora porque haverá sempre juízes ou juízas que tomam más decisões, ora porque o que é preciso mudar são as mentalidades. Ignorar, por exemplo, que o enquadramento legal atual potencia as penas suspensas para penas abaixo de 5 anos para este tipo de crimes é deixar as vítimas expostas a mais violência.
Assim, a Assembleia Municipal de Loulé, reunida em 5/4/19, delibera, ao abrigo do artigo 25.º, n. º2, alíneas j) e k) do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro:
1. Saudar todas as manifestações e concentrações que, nas últimas semanas ocorreram por todo o país exigindo medidas efetivas de combate à violência de género;
2. Exigir ao Governo e à Assembleia da República que tomem o combate à violência de género como prioridade política efetiva;
3. Instar aos respetivos órgãos de soberania a procederem às seguintes medidas:
a. Alteração das molduras penais para os crimes de violência doméstica, sexual e contra menores;
b. Adequação do Código Penal à Convenção de Istambul, cumprindo as recomendações do GREVIO no último relatório sobre a aplicação da Convenção em Portugal, estabelecendo o consentimento como linha vermelha do crime de violação e consagrando o crime de violação como crime público;
c. Extensão da aplicação de prisão preventiva a crimes de violência doméstica e proibir a aplicação do instituto da suspensão provisória do processo a este tipo de crimes;
d. Garantir a articulação entre o processo crime e o processo de regulação das responsabilidades parentais (quando exista). Não é possível separar estes dois processos, deixando as vítimas mais vulneráveis perante o agressor;
e. Aplicação das medidas de coação “proibição de contacto e imposição de condutas” ao crime de perseguição (stalking), pois é um passo para garantir a proteção da vítima durante a fase de inquérito.
4. Instar o Governo a acelerar os processos de formação e sensibilização dos e das várias agentes nos processos de violência: juízes e magistrados, forças de segurança, assistentes sociais, técnicos de saúde.
5. Instar o Governo a iniciar o processo de debate alargado para a criação de equipas multidisciplinares especializadas.
6. Remeter esta moção ao Governo, Presidente da Assembleia da República e Grupos Parlamentares.
Loulé, 5 de Abril de 2019
Grupo Municipal do Bloco de Esquerda
Carlos Martins
Anexo | Tamanho |
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mocao_do_be_pelo_combate_a_violencia_de_genero.pdf | 1.21 MB |